AMOR PROFILÁTICO Mulheres Cheias de Graças Pe. Fábio de Melo


Escutou a palavra e notou que era bonita. – Profilá-tico – repetiu. Sussurrava. Prolongava as sílabas. Não queria
se desprender do gozo. Agia como se fosse escritora e
naquele momento estivesse se exercitando no ofício de
investigar a riqueza semântica do vocábulo.
“Profílático, profílático.” Os olhos fechados pareciam
procurar a direção das origens do mundo, dando-me a impressão
de que aquela palavra recém-descoberta possuía o poder
de lhe devolver ao estado primeiro das coisas, ligando-a novamente a um paraíso perdido, fíndado, porque esquecido.
O rosto testemunhava o espírito compungido. A fala mansa e repetida sem ansiedade era uma espécie de prece, palavra que ordena, direciona, redime. Nesse ímpeto de encantamento e paixão pela palavra,ela resolveu concluir, ainda que absorta em inexata compreensão: – O amor que sinto por Jorge é profílático.
– Repetiu a frase como se quisesse investigar os desdobramentos
práticos daquele amor e quem sabe, assim,compreender o signifícado da palavra.A doçura na voz emoldurava a expressão. Conferia--lhe um contexto de amabilidade nunca antes alcançado
por outro vocábulo. A palavra a atingia e a afetava de maneira
inesperada e surpreendente.
Eu também escutei sem entender. Mergulhei no mistério
do desconhecido termo e não o quis por sua lógica.
Acolhi a força sonora e musical, e só. Não tive coragem de perguntar, nem tampouco procurar saber, o que signifícava “profílático”. Temia atentar contra a sacralidade do termo.Abracei a sonoridade e a assumi como verdade. Amor profílático deve ser um amor cheio de profundidade,empenho, lisura. Manhãs de inverno e luz tímida de lamparina acesa. Mulher à beira de um fogão alimentado de lenha seca e café deslizando suavemente pelo coador de pano encardido.
A vida de um amor profílático deve ser assim. Coisas lindas costurando as feiuras do dia, cobrindo de bordados cheios de minúcias os avessos e suas ranhuras. Amor que recobre de brilho a estrutura opaca da existência e transforma
o cotidiano da vida num acontecimento único, fato que não merece cair no esquecimento.................

Pe. Fábio de Melo

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